Beatriz Sayuri Vieira Ishigaki – A. C. Camargo Câncer Center, SP

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Resumo da história clínica

Paciente do sexo masculino, 31 anos, sem antecedentes relatados, evoluindo com história de cefaleia refratária e hemisparestesia direita com evolução de 1 ano. À investigação, foi realizada ressonância magnética, a qual revelou lesão nodular cerebral heterogênea e parcialmente cística em região frontal esquerda, medindo 1,5cm no maior eixo.

Foi submetido à ressecção cirúrgica no serviço de origem, com diagnóstico histopatológico de neurocitoma central. Solicitada segunda opinião diagnóstica para programação terapêutica em hospital de referência, no qual foi realizado o diagnóstico de neoplasia neuroepitelial com diferenciação glial, sem outras especificações, baseado em achados histológicos e imuno-histoquímicos. À microscopia convencional, foi identificada densa proliferação de células pouco atípicas, com núcleos arredondados e citoplasma eosinofílico e em geral amplo, arranjadas em manto ou em pseudorrosetas perivasculares, com crescimento expansivo e infiltrativo, e com proeminente microvascularização própria. Foram identificadas até 3 figuras de mitose/10 campos microscópicos contíguos de grande aumento (400x/0,56mm de diâmetro) e pequeno foco microscópico de necrose, sem proliferação microvascular com endotélio reativo e estratificado associado. Ao exame imuno-histoquímico realizado nesta instituição, foi demonstrada positividade consistente para S100, GFAP e Olig2, positividade fraca para sinaptofisina, positividade focal (raras células) para SOX10, positividade parcial para ciclina D1 e imunonegatividade para todos os demais marcadores (IDH1 (R132H – clone H09), cromogranina A, CD34, PAX2, PAX8, NeuN, EMA, TTF1, D2-40, CK8/18, AE1/AE3, L1CAM e neurofilamento. A expressão de H3K27me3 e ATRX foi preservada, assim como p53 e p16 foram não aberrantes (padrão selvagem). O índice proliferativo estimado por ki67 (MIB-1) foi estimado em torno de 2 – 3%.

Mediante estes achados e após discussão anatomoclínica, o material emblocado em parafina foi submetido a exames moleculares complementares. O sequenciamento genético, realizado na mesma instituição revisora (sequenciamento paralelo em larga escala – TSO500), identificou fusão EWSR1 (éxon 8)::PATZ1 (éxon 1) (137 leituras), com baixa carga mutacional tumoral (TMB) (1 mutação/Mb) e estabilidade de microssatélites, já sendo proposto o diagnóstico de Tumor neuroepitelial com fusão de PATZ1. Em paralelo, o perfil de metilação do DNA foi realizado em instituição parceira e também foi compatível com o diagnóstico proposto de Tumor neuroepitelial com fusão de PATZ1.

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Referências

  • Alhalabi KT et al. PATZ1 fusions define a novel molecularly distinct neuroepithelial tumor entity with a broad histological spectrum. Acta Neuropathol. 2021 Nov;142(5):841-857. doi: 10.1007/s00401-021-02354-8. Epub 2021 Aug 21. PMID: 34417833; PMCID: PMC8500868.
  • Siegfried A, Rousseau A, Maurage CA, Pericart S, Nicaise Y, Escudie F, Grand D, Delrieu A, Gomez-Brouchet A, Le Guellec S, Franchet C, Boetto S, Vinchon M, Sol JC, Roux FE, Rigau V, Bertozzi AI, Jones DTW, Figarella-Branger D, Uro-Coste E. EWSR1-PATZ1 gene fusion may define a new glioneuronal tumor entity. Brain Pathol. 2019 Jan;29(1):53-62. doi: 10.1111/bpa.12619. Epub 2018 Jul 13. PMID: 29679497; PMCID: PMC8028282.
  • Fontaine A, Basset L, Milin S, Argentin J, Uro-Coste E, Rousseau A. Tumeur neuroépithéliale avec fusion PATZ1 – à propos d’un cas et mise au point sur une entité mal définie [Neuroepithelial tumor with PATZ1 fusion – case report and focus on an ill-defined entity]. Ann Pathol. 2024 Feb 9:S0242-6498(24)00006-3. French. doi: 10.1016/j.annpat.2024.01.002. Epub ahead of print. PMID: 38341312.
  • Ene A, Di J, Neltner JH, Pittman T, Arnold SM, Kolesar JM, Villano JL, Bachert SE, Allison DB. Case report: A unique presentation of a high-grade neuroepithelial tumor with EWSR1::PATZ1 fusion with diagnostic, molecular, and therapeutic insights. Front Oncol. 2023 Jan 31;13:1094274. doi: 10.3389/fonc.2023.1094274. PMID: 36816978; PMCID: PMC9928596.
  • Kim H, Lee K, Phi JH, Paek SH, Yun H, Choi SH, Park SH. Neuroepithelial tumor with EWSR1::PATZ1 fusion: A literature review. J Neuropathol Exp Neurol. 2023 Oct 20;82(11):934-947. doi: 10.1093/jnen/nlad076. PMID: 37804108.

Diagnóstico final

Tumor neuroepitelial com fusão de PATZ1.

Handout

O tumor neuroepitelial com fusão de PATZ1 é um tipo tumoral recente, não reconhecido pela classificação de 2021 da WHO, porém já identificado como entidade com perfil de metilação próprio e distinto das demais neoplasias (1,4). Costuma ter maior incidência em crianças e jovens adultos, com idade média de 20.4 anos. É uma entidade de difícil diagnóstico pelas suas características morfológicas variadas e não específicas. Na maioria dos casos, são proliferações densamente celulares de céluas de formato e padrão variáveis, com núcleo monomórfico, morfologia glioneuronal e localização ventricular. Pode ainda apresentar pseudorrosetas perivasculares de tipo ependimária, características astroblásticas, densa rede de reticulina, ocasionais microcalcificações e rica rede vascular, com vasos sanguíneos hialinizados (2). Pode apresentar características de baixo grau, como as citadas anteriormente, e até mesmo alto grau, com atipia intensa, necrose em paliçada, núcleos pleomórficos e hipercromáticos, além de aumento no número de mitoses atípicas. Há expressão variável de Olig2, sinaptofisina e GFAP (3). Devido à heterogeneidade histológica e ao padrão neuroepitelial polifenotípico, vários outros diagnósticos diferenciais possíveis podem ser considerados, como glioblastoma, ependimoma, tumores embrionários, xantoastrocitoma pleomórfico, gliomas e tumores neuroepiteliais com diferenciação sarcomatosa (5). Apesar de sua variabilidade, tal neoplasia é geneticamente definida e se diferencia dos demais tumores do sistema nervoso central pela presença da fusão do gene PATZ1 com genes parceiros (como EWSR1 e MN1), em geral reguladores de processos celulares, mais comumente causada por inversão em cromossomo 22. Quanto ao prognóstico, costuma ser comparável ao de neoplasias de grau histológico intermediário. O diagnóstico definitivo requer a integração de todos os achados anatomopatológicos, inclusive moleculares (1).

O paciente deste caso foi submetido à nova abordagem cirúrgica para retirada de remanescente lesional, com achados anatomopatológicos similares. Está em acompanhamento, e, devido ao crescimento de nova lesão, há avaliação para tratamento complementar.